domingo, 17 de agosto de 2008

PSICOLOGIA DESPORTIVA: O NOVO PASSO

Lendo o excelente novo blog do Marcelo Barreto, jornalista do Sportv, assim como ouvindo reiteradas considerações sobre o tema na cobertura das Olimpíadas, acho que devo abordar o tema da hora: a eventual falta de preparo psicológico de nossos atletas.

Os brasileiros que chegam como favoritos nos Jogos, já há algumas edições, não conseguem, via de regra, confirmar sua condição e acabam não conquistando o resultado esperado.

O que falta? Como explicar a discrepância entre o desempenho de certos atletas ou equipes nos Jogos Olímpicos e nos Mundiais e outras competições que o precedem?

Tomando o exemplo concreto dos Jogos de Pequim, em que o problema atacou nossos judocas e nossos ginastas, vê-se que, no caso mais recente, que "vitimou" Diego Hypólito, a tendência que tenho visto é que se considere o episódio como uma fatalidade. De fato, como já destaquei em post anterior (Dores do Crescimento), quedas são uma circunstância mais comum do que se pensa na Ginástica de alto nível. O risco assumido pelos atletas é enorme e exige nada menos do que a perfeição na execução dos movimentos que compõem a série. Como não são máquinas, os ginastas acabarão penando com uma queda numa hora decisiva.

Mas por que os nossos casos sempre são nas Olimpíadas? Primeiro, porque os fatos não são exatamente estes. A cobertura da imprensa só se dá de forma ampla e detalhada na época dos Jogos. Quantas vezes será que Jade, Diego e Daiane não cometeram faltas que lhes tiraram pontos preciosos em competições internacionais das quais não houve mais do que uma nota na pé da penúltima página da seção de esportes dos jornais?

Em segundo lugar, novamente a atenção pública. Em nenhum momento, nem nos Mundiais que conquistaram (e neste caso se enquadra até mesmo o Judô que teve seu campeonato sediado aqui no Brasil em 2007), os atletas brasileiros estão em tanta evidência como neste período. A pressão aumenta exponencialmente. São muitas as exigências extra-desportivas e as novas fontes de pressão, por parte de patrocinadores, torcedores, jornalistas ou apenas curiosos que se julgam, até mesmo de boa-fé, aptos a comentar ou dar conselhos sobre o desempenho dos atletas.

Bernardinho, paradigma de treinador, sempre fala da necessidade do estabelecimento do foco do desportista na sua atividade; na mentalização e na concentração absoluta para a execução de cada movimento.

Suspeito que, no caso de Diego, ele possa ter antecipado, já na última diagonal de sua série, que sua tarefa estava praticamente terminada, que o esforço de anos de treino estava prestes a ser justamente premiado. É neste momento em que o atleta se desconcentra e não tem a percepção dos movimentos que deve fazer.

Mas isto pode ser outro "pitaco" de curioso de que falei três parágrafos acima...

No Judô, outras considerações. Tiago Camilo simplesmente foi superado por um atleta que lutou melhor. Já João Derly e Luciano Corrêa pareceram visivelmente contidos no papel de favoritos. Em momento algum impuseram sua condição de campeões mundiais, deixando que os adversários conduzissem os combates.

A questão da preparação psicológica passa por estes temas: a mente e o espírito dos atletas de ponta deve estar condicionada a só pensar na tarefa a ser feita, não em suas consequências. Deve-se pensar na melhor execução possível para as manobras de sua modalidade. Neste ponto, um exemplo notável são as medalhas de bronze de Leandro Guilheiro e Katelyn Quadros. Suas expressões, até o final, foram de absoluta concentração, foco exclusivo na preservação de energia, contenção de emoções e antecipação de estratégias para enfrentar seus adversários.

Outro ponto merecedor de atenção é a postura que deve cercar a assunção da condição de favorito. O limite entre a prepotência e a segurança e a própria imposição psicológica que o atleta mais qualificado deve projetar sobre seu oponente, como vantagem competitiva. Neste caso, já é unânime o modelo estabelecido por Cesar Cielo, que não teve medo de afirmar que ganharia - como ganhou - os 50m livres.

Era esta a mesma postura do Romário, quando garantia que iria marcar os gols necessários; quando prometeu que iria conquistar o tetra.

Por fim, a nossa culpa como torcedores. Vendo o Diego Hypólito pedir, como outros já o fizeram, desculpas pelo seu desempenho, tive a certeza que a pressão que o país põe sobre seus atletas é quase insuportável. Como afirmei no post que inaugura este blog, o esporte talvez seja um dos únicos campos em que o brasileiro consegue exercer seu orgulho nacional.

Os atletas sabem disto, sentem na pele, vêem nos olhos e ouvem nas palavras de quem os aproxima neste período.

Parte disto só se resolve com o maior desenvolvimento da cultura desportiva no país, em que somente um "salvador da pátria" para algumas modalidades, mas na qual tenhamos quantidade suficiente para extrair qualidade de forma constante, tal como fazemos no futebol.

A outra parte só será superada com o treinamento psicológico, com uma maior seriedade em trabalhar o velho lema latino que inspira a prática desportiva: mens sana in corpore sano.

2 comentários:

Anônimo disse...

Riquíssimo em conteúdo este último texto postado por você. Como diria um mais antigo “da pano pras mangas”. Apenas faço, como habitualmente, algumas observações, na esperança que alguém aceite ou critique.
Uma primeira pergunta é a seguinte: quem determina o favoritismo de certo atleta, ou de determinada equipe, além de seus resultados? No caso específico dos nossos ginastas. Alguém sabe, por exemplo, a opinião das imprensas coreana, japonesa ou alemã sobre eles. Nem desconfio. O favoritismo atribuído pela nossa imprensa não poderá ser tendencioso? Tenho visto na grande mídia, como em qualquer outra atividade, torcedores fanáticos e, pelo amor de deus, não me venham falar em imparcialidade ou olhar isento.
No caso mais específico, que envolveu o Diego Hypólito, acho que não cabe dúvida quanto a sua capacidade, mas atribuir a uma fatalidade seu insucesso é esquecer o que aconteceu com a Jade e a Dianne; resumindo: é muita fatalidade junta. Acho que algo ainda falta para garanti-los num lugar mais alto do pódio e esse algo me parece passar por um condicionamento psicológico, se é que isto existe, tão forte e intenso quanto o treinamento físico.
Parece-me também que esta enorme exposição a que estes atletas são expostos nos dias que antecedem à competição só pode fazer mal. É muita interferência, fica difícil manter o foco.
Finalmente, para não dizer que não estou abrindo espaço para uma polêmica, venho muí respeitosamente discordar quando você fala em culpa do torcedor. Não pretendo ensinar o padre-nosso ao vigário, ai de mim! Mas culpa cheira a crime, conduta negligente, falta voluntária, o que não é o caso. Se existe uma pressão em cima do atleta, e eu não a nego, ela faz parte do ônus da carreira de atleta de ponta. Afinal, se nossos ginastas querem uma carreira que só privilegie o bônus, eu sugiro que se candidatem a vereadores e prefeitos. Ainda está em tempo.
Desconfio que concordamos mais do que discordamos.

Anônimo disse...

O debate a três está ficando bom por aqui, hein, Animal?! Fiquei uns dois ou três dias sem conseguir participar, mas hoje volto à cena.
Concordo com o Beto em relação à falta de culpa da torcida e acrescento que a mídia também não tem responsabilidade sobre fracassos de atletas. Ora, se alguém é campeão mundial e obteve resultados expressivos na temporada, é dever noticiar e opinar que fulano ou cicrana competem com a responsabilidade de favoritos. E o bom competidor vai conseguir administrar essa condição nas vitórias ou derrotas.
Preparo psicológico falta e muito, principalmente para nossa equipe de ginástica! A Jade é exemplar neste aspecto. De aterrorizada ao chegar à China e encontrar tantos jornalistas atrás dela, deu sua despedida na TV com uma declaração que dizia, se não me engano, literalmente, 'ainda bem que já acabou'...
Acho que também falta planejamento. O Cielo ganhou a medalha de ouro porque treinou para atingir o ápice nas Olimpíadas. Enquanto isso, a equipe de ginástica (sempre ela!) fazia a festa de pódios em Mundial e etapas da Copa do Mundo sem que os principais rivais se preocupassem com essas derrotas, pois estavam se poupando para o prato principal.
Por fim, para discordar do escriba do blog, devo dizer que a ginástica artística (de novo ela!) é cruel com o atleta, sim, exige perfeição constantemente. Mas, como bem disse o Beto, o que acontece com nossos Diegos, Daianes e Jade é muita fatalidade junta!