quarta-feira, 6 de agosto de 2008

OLIMPÍADAS, PLURALISMO E PATRIOTISMO

Acabei de assistir o filme oficial dos Jogos de 2004, em Atenas. O que foi concebido como uma grande peça de propaganda individual do Presidente do COI, o belga Jacques Rogge, acaba revelando, para quem o assiste com olhos, digamos, olímpicos, imagens e sentimentos belíssimos.

Devo confessar que cheguei às lágrimas revendo a Cerimônia de Abertura, que evocou o ideal humanista que inspira o Olimpismo e o retorno dessa celebração da humanidade ao seu berço.

Também me emocionei ao ver as tomadas, algumas inéditas, dos momentos de empenho e júbilo dos atletas, inclusive passagens particularmente tocantes para nós brasileiros: o beijo de Ricardo e Emanuel em suas medalhas de ouro, a celebração das meninas do Basquete e a chegada de Vanderlei Cordeiro de Lima no antigo Estádio Olímpico, onde terminou a maratona.

Uma passagem resume bem a beleza e a magia dos Jogos Olímpicos: um dos dirigentes do COI, especificamente responsável pela área de segurança do evento, afirma que a maior proteção das Olimpíadas é a manutenção e a promoção do seu caráter não-sectário, não-religioso, não-político. Em outras palavras, os Jogos são a celebração da natureza plural do gênero humano, em que os triunfos são medidos pelas capacidades essenciais de cada atleta.

Diante de tal constatação, surge a pergunta óbvia: onde há lugar para o patriotismo nesta festa da igualdade entre os povos? (afinal, já foi dito que o patriotismo é o último refúgio dos canalhas)

A resposta pode estar numa idéia desenvolvida pelo filósofo alemão Jurgen Habermas, que numa discussão sobre a possibilidade da Alemanha, traumatizada pela vergonha do nazismo, desenvolver e demonstrar alguma espécie de nacionalismo. Sua proposta aponta para o conceito de patriotismo constitucional, em que o orgulho de ser alemão deveria residir na capacidade de construir uma sociedade democrática e igualitária depois de afundar na tragédia hitlerista.

Pois bem, o patriotismo desportivo é, talvez, outra das poucas formas saudáveis de nacionalismo, na medida em que o orgulho cidadão é despertado pela celebração de seus heróis olímpicos, pela constatação de que, no panteão de glórias que a cada quatro anos a Humanidade inteira ergue, há um pedaço, maior ou menor, ocupado por alguém que divide algo em comum com cada um de nós.

O patriotismo despertado pelos Jogos merece seu lugar, pois permite que meçamos forças entre nós, sem a necessidade de eliminarmos o adversário, até porque a disputa esportiva pressupõe não só a existência do outro, mas o próprio reconhecimento de seu mérito e de suas virtudes, que só engrandecem nossa eventual vitória.

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