domingo, 17 de agosto de 2008

A PROVA-SÍNTESE: O BRASIL OLÍMPICO QUE QUEREMOS SER

Escrevo mais de 24 horas depois do momento sublime proporcionado por Cesar Cielo no dia 15/08/2008 (ou seria 16?). O ímpeto de lançar um post imediatamente depois foi quase irresistível, mas as noites de judô cobraram seu tributo e, depois de me emocionar profundamente com o "Cesão", acabei dormindo com o controle remoto na mão.

Acordei no sábado em meio ao futebol e ao vôlei (de praia e de quadra) e depois fui cumprir minhas tarefas domésticas, só conseguindo parar agora, após assistir o massacre da Walsh e May-Treanor sobre nossa dupla número 1 no Vôlei de Praia.

Mas a repercussão da conquista no dia de hoje me consolidou a idéia de que a vitória de Cielo nos 50m livres da natação sintetiza as virtudes que se busca encontrar num desportista.

Se as imagens de sexta à noite (sábado de manhã) pudessem ser traduzidas numa palavra, esta seria explosão. A prova dos 50m livres se caracteriza pela explosão imposta aos e pelos atletas, numa profusão de braços e pernas que fazem água jorrar por todos os lados; que provocam um verdadeiro maremoto em piscinas projetadas para não fazer marolas.

Desse torvelinho, surgiu, após pouco mais de vinte segundos, a figura vitoriosa de Cesar Cielo, em nova explosão, agora de emoção, sobre a raia; afundando n'água; socando a piscina; chorando dentro e fora dela.

Esse furor que cerca uma prova e uma vitória dessas faz bem o gosto dos brasileiros, que não ocultamos nossas emoções, mais do que isto, as cultivamos carinhosamente, buscando-as em seu grau mais intenso para conseguirmos extrair momentos únicos de felicidade em cada campo de nossas vidas.

Portanto, a uma primeira vista, a conquista de Cesar Cielo seria a celebração do nacionalmente conhecido "vamo que vamo", a vitória conquistada na marra, na última hora, com uma virada, uma explosão históricas, que redime nosso preparo pouco adequado.

Mas a análise menos superficial revela justamente ao contrário: Cesar Cielo não foi "inventado" de ontem para hoje; não apareceu como um relâmpago surgido do nada. O novo ídolo brasileiro é fruto da abnegação que o levou do aconchego de Santa Bárbara d'Oeste para uma São Paulo gigantesca, especialmente para um menino que vai em busca de treinar com seu ídolo, Gustavo Borges.

O ícone que se cristalizou na noite-madrugada-manhã de meados de agosto de 2008 não se formou em dois ou três dias de apresentação no Cubo d'Água, mas, em anos de dedicação solitária aos treinos em piscinas no Brasil e, depois, nos Estados Unidos, para onde partiu sozinho, sofreu com saudades da família, mas já brilhava intensamente tanto na Natação, como na vida acadêmica, já que fora nadar por uma universidade americana.

A vitória não foi conquistada com paixão, com braços e pernas que se debatem a esmo; mas com razão a cada milésimo de segundo, que se reflete na adequada técnica de cada movimento, e guarda o coração para torná-lo capaz de segurar o fôlego no momento crucial de sua vida desportiva e pessoal.

Ou seja, a paixão explode no momento da vitória, depois de "ver o número um antes do seu nome". Antes só há suor, dedicação, razão, consciência.

A conquista de Cesar Cielo é a conquista de todos os brasileiros, porque ele representa o que um herói olímpico deve refletir: nossa capacidade de ir além de nossos limites; a possibilidade de revelarmos o que temos de melhor, superando nossas fraquezas. Ou seja, nosso povo foi capaz de produzir um que vai além de nós.

Cielo é justamente isto: um herói que nos mostra o caminho a seguir, aquele estreito, íngreme, pedregoso, da dedicação diária, da disciplina, da razão e da concentração. Cesar Cielo é a prova de que se superarmos nossa atávica tendência ao "oba-oba", podemos conquistar o inimaginável e, mais do que isto, podemos extrair nossas já tradicionais alegria e paixão de momentos de razão, dedicação e foco absoluto na tarefa, não no prêmio.

E até no que a vitória de Cielo é só dele, pois o apuro que lhe trouxe duas medalhas e três recordes olímpicos foi obtido no sistema desportivo universitário dos Estados Unidos, ainda assim seu exemplo nos serve de guia, mostrando o caminho do esporte escolar, do esporte universitário como o melhor meio para nos transformarmos efetivamente numa potência olímpica.

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