segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

ENTRE O CAMPO E O TAPETE: O FUTEBOL BRASILEIRO ESCOLHE SEU FUTURO

Reabro os trabalhos deste modesto bloguinho dando breve pitaco sobre a polêmica da hora: o julgamento de Portuguesa e Flamengo pelo STJD, em virtude da escalação de jogadores pretensamente sem condições de jogo.

Não entrarei nas minúcias técnicas que certamente serão esgrimidas amanhã pelos diversos advogados envolvidos no caso. Também não venho aqui dar vazão à minha notória paixão rubronegra. Minha preocupação é com mais um ataque à integridade do maior produto esportivo do Brasil.

No momento em que o país poderia comemorar dez anos de estabilidade no sistema de competição de nossa principal liga esportiva, estamos dando muitos passos para trás, ao deixar o circo jurídico ser montado ao redor da decisão da maior atração do campeonato brasileiro em sua última rodada: a briga para escapar do rebaixamento.

Diante das inúmeras interpretações que foram veiculadas nos últimos dias sobre os múltiplos dispositivos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), impõe-se que a solução para o caso concreto PASSE pela aplicação dos princípios que estabelecem os grandes objetivos da legislação que rege o esporte em geral e o futebol em particular.

Neste caso, destaca-se o texto do art.2º, XVII do CBJD: "A interpretação e aplicação deste Código observará os seguintes princípios, sem prejuízo de outros:... prevalência, continuidade e estabilidade das competições (pro competitione)"

Como se vê, a legislação esportivo-disciplinar visa a preservar o resultado obtido em campo. O objetivo de punir as equipes que escalam atletas sem condições de jogo é não distorcer as condições de competição. Pergunta-se: a escalação de um reserva num jogo em que a Portuguesa não tinha quase nenhuma possibilidade de rebaixamento (e para o qual o resultado do Fluminense era irrelevante, somente o Vasco, que perdeu, poderia rebaixá-la, e ainda assim se tirasse uma diferença de onze gols de saldo) trouxe alguma alteração relevante no curso do campeonato?

Adicionalmente, a escalação de André Santos num jogo que tanto não valia nada que foi antecipado, trouxe alguma modificação na classificação?

A resposta negativa a ambas as perguntas aponta para a interpretação que deve ser adotada na aplicação dos dispositivos do CBJD.

Evidente a ausência de dolo na inclusão de tais jogadores nos elencos que disputaram a última rodada,a gradação da pena deve guardar maior contenção. Havendo precedente, neste mesmo campeonato, de clube apenado somente com multa por conta de escalação irregular de jogador, constata-se que a infração não precisa restar impune, mas pode ser sancionada de forma a não alterar o resultado final do campeonato, aplicando-se multa às entidades acusadas, como forma de repreender sua atitude culposa, mas sem subverter o mérito atlético de quem se livrou do rebaixamento dentro de campo.

A preservação do resultado esportivo conta com chancela jurídica de nível hierárquico ainda maior, na medida em que a própria Lei Pelé (Lei nº 9.615, 24/03/98) consagra o princípio da qualidade esportiva no seu art.2º, IX, correspondendo à ideia de "valorização dos resultados desportivos".

Para arrematar, o princípio da valorização do resultado desportivo também encontra eco em outra lei federal, o Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei nº 10.671, de 15/05/2003), já que seu art.10 afirma que "é direito do torcedor que a participação das entidades de prática desportiva em competições organizadas pelas entidades... seja exclusivamente em virtude de critério técnico previamente definido." E vai mais além em seu §1º: "Para os fins do disposto neste artigo, considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de colocação obtida em competição anterior."

Portanto, distorcer a classificação por conta de medidas jurídicas calcadas em explícito e incompreensível formalismo é dar um tiro de morte em todo este conjunto normativo, erigido sobre a indignação social com o histórico de recursos ao tapetão que tinham levado o futebol brasileiro a uma situação de absoluto descrédito.

A sobreposição da forma sobre o conteúdo acabará por fulminar a credibilidade do futebol brasileiro, em momento crucial para sua história, no qual a realização da Copa do Mundo pode representar uma plataforma de lançamento de uma liga esportiva de repercussão mundial.

Desta forma, a aplicação de multa aos clubes que pretensamente atuaram irregularmente preserva a integridade do regulamento, enquanto não distorce os resultados esportivos, evitando que se escarneça da fé que milhões de torcedores depositam na importância e na lisura do futebol brasileiro.

E assim, a auditores abnegados que dedicam gratuitamente seu tempo ao esporte, relembra-se que o futebol se joga em campo. A bola não consegue rolar nos grossos tapetes que decoram os tribunais.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

CAMISA 12 DA GÁVEA

Sei que vou eventualmente "apanhar" muito por conta de tal afirmação, mas trata-se de divagação de um rubronegro apaixonado por seu time. Entre terça e quarta-feiras vi duas passagens na TV que me despertaram para algo que vinha pensando há algum tempo. Vamos aos programas televisivos e, depois, à divagação propriamente dita.

Primeiro foi o filme sobre o tricampeonato mundial do São Paulo, veiculado pela ESPN, em que se dá grande destaque, obviamente, ao Rogério Ceni, verdadeira bandeira do Tricolor Paulista. Tanto pela sua expressão naquele - e no atual - time do São Paulo, quanto pela sua atuação em si no jogo contra o Liverpool, que passou praticamente os 90 minutos bombardeando a meta são-paulina (que diferença para o meu Mengão, que passou o carro sobre um Liverpool consideravelmente mais forte do que aquele de 2005...). Pelo depoimento emocionado do próprio Rogério no final do filme, assim como pela noção consolidada do que ele representa na história do clube, deu-me aquela ponta de inveja saudável da existência de um ídolo deste quilate no time dos outros.

O segundo estímulo veio hoje, quando me arrumava para ir para o trabalho e, ouvindo, como de hábito, o SporTV, deparei-me com a declaração do Bap, Vice-Presidente de Marketing do Flamengo, que, ao apresentar o novo patrocínio da Caixa, afirmou mais uma vez que as contratações virão do dinheiro do programa de sócio-torcedor (aliás, eu já sou. E vc, companheiro rubronegro, já cumpriu seu dever cívico?). Em outras palavras, a atual diretoria do Flamengo confia no poder e no compromisso da Maior Torcida do Mundo para construir um time mais forte.

Nesta hora me veio a imagem da camisa 12, parcialmente aposentada nas hostes da Gávea (parcialmente, porque nos torneios da Conmebol é obrigatória a utilização de tal numeração, sob pena de se perder a inscrição de um jogador), em homenagem à força da torcida. Em outras palavras, a camisa 12 do Flamengo agora é vestida pelo seu torcedor.

Feito este introito, eis meu devaneio: o Flamengo clama por um ídolo, mas daqueles de verdade, efetivamente identificado, nas suas entranhas, com esta Nação Rubronegra dentro da Pátria Desportiva que tanto enalteço aqui neste bloguinho. Depois das decepções com Adriano, R10 e Vagner Love, a torcida precisa de um espelho dentro do campo, alguém que tenha não só a garra que o atual time vem desenvolvendo, mas a estatura que a "urubuzada" naturalmente arrogante atribui ao Clube de Regatas do Flamengo.

Mas o clube está sem dinheiro, a própria diretoria passou a bola para a torcida: institucionalizem sua paixão no programa sócio-torcedor, e nós traremos os craques.

Pois bem, se é para resolver com a camisa 12, nada melhor do que trazer o melhor camisa 12 dos últimos tempos: Júlio César. O goleirão, que vem sendo convocado pelo Scolari - não sem muitas contestações - está parado no banco de um time virtualmente rebaixado no Campeonato Inglês. Para realizar seu sonho de jogar mais uma Copa do Mundo, Júlio César precisará jogar. Embora haja notícias de que ele teria mercado nos clubes da Premier League (fala-se até mesmo em Manchester United ou Arsenal), o risco de ser contratado e não jogar é grande, afinal, goleiro precisa de tempo para consolidar uma nova titularidade.

Dinheiro, vamos combinar, o nosso arqueiro não precisa. Todo mundo gosta de mais um pouco, mas, como se diz comumente, dinheiro não é tudo - especialmente para quem já tem algum, como é o caso de Júlio César. Portanto, porque não juntar o útil (ter maiores chances de ser titular num time de expressão), ao agradável (dar uma de Juninho Pernambucano e voltar ao time de coração, sem cobrar horrores de salário)?

Reativa-se excepcional e temporariamente a camisa 12, entrega-se ao Júlio César como reconhecimento de seu genuíno amor pelo Flamengo e, em paralelo a um salário compatível com a atual política de austeridade da Gávea, arruma-se um esquema de remuneração por resultados, tal como o Vasco fez com o mesmo Juninho.

Agora, minha viagem da madrugada: ainda pode-se cogitar de criar uma ação de marketing específica que gere receita adicional para o goleirão. Fixa-se novamente a ideia de que a camisa 12 é da torcida, e que Júlio César jogará com ela porque ele é o torcedor em campo. Aumenta-se a força do ídolo que ele já é (e o próprio Júlio César historicamente prefere jogar com este número), cria-se um produto com grande capacidade de identificação com a torcida - e, por conseguinte, com elevado potencial de venda -, atribuindo-se uma parte da receita das vendas da camisa para o próprio jogador, complementando sua renda sem comprometer o equilíbrio financeiro do clube.

É bom para o Júlio César, que volta a jogar; é bom para a torcida, que volta a ter um ídolo de verdade em campo; é bom para o time, que conta com um jogador com a rodagem de anos nas ligas mais competitivas da Europa; e é bom para o clube, que reforça uma marca mal explorada (a camisa 12 da Gávea) e dá um estímulo adicional ao necessário envolvimento de sua torcida.

Será que viajei demais?

terça-feira, 30 de abril de 2013

ESTAMOS NOS PERDENDO

Depois de mais um longo inverno - na verdade um verão, pois a última postagem foi em setembro de 2012 - longe do blog, volto a dar meus pitacos por aqui, preocupado com o que temos adiante, tanto na Copa, quanto nos Jogos Olímpicos.

Com a reinauguração do Maracanã e todas as já esperadas celeumas em torno de seu projeto - porque já era sabido que iria haver uma porção de gente querendo tirar sua "casquinha" quando os Megaeventos chegassem, e agora todo mundo se descobre "proprietário" ou "defensor" não só do estádio, mas de todos os seus arredores -, vejo que estamos nos perdendo e, para além de estarmos deixando passar uma oportunidade única de utilizarmos o esporte como uma plataforma para o desenvolvimento do país, estamos comprometendo nosso próprio desempenho esportivo em tais competições.

O nosso futebol a cada dia revela sua indigência escandalosa: campeonatos estaduais que nada acrescentam, a não ser cabelos brancos nos pobres coitados dos treinadores que não o conquistam; clubes em estado muito além da falência; uma seleção que se vulgariza e joga no lixo uma mitologia construída ao longo de décadas.

No esporte olímpico, todos agora se dizem surpresos com a derrubada dos espaços de atletismo e natação no Complexo do Maracanã. Há pelo menos cinco anos é conhecida a intenção do Estado em abrir novas áreas para exploração comercial no Maracanã. Ninguém pensou numa solução que não fosse ficar esperneando? O projeto olímpico do Rio já previa a derrubada do Velódromo. A CBG precisou ser pressionada por um campeão olímpico em rede nacional para distribuir os equipamentos que estavam sobrando do antigo Centro de Treinamento? Ninguém lembrou que o Maria Lenk iria fechar para obras de adequação às exigências dos Jogos de 2016?

Todos cinicamente surpresos, escondendo sua falta de planejamento atrás de uma nem tão bem ensaiada indignação.

Estamos nos perdendo, e iremos perder muito mais quando 2014 e 2016 chegarem, se não passarmos a levar o assunto a sério, pararmos de nos comportar como adolescentes inconsequentes e assumirmos o ônus de planejar e executar alternativas viáveis e racionais, e não esperar que tudo se ajeite com base na benevolência do Estado Brasileiro ou de empresários que estão investindo milhões na esperança que o esporte brasileiro se torne uma indústria digna do nome.