quinta-feira, 4 de junho de 2009

PONTAPÉ INICIAL PARA A COPA DE 2014. (Ou Sobre Elefantes Brancos)

Escolhidas as cidades que sediarão jogos da Copa de 2014, a palavra oficial da CBF, pela voz do seu presidente, Ricardo Teixeira, foi de que este não é fim da caminhada das candidaturas, mas o início de um processo de capacitação de cada uma delas para honrar os compromissos do Brasil com a FIFA (sim, porque não foi só a CBF, mas diversos níveis governamentais que afiançaram as propostas relativas à Copa do Mundo que se realizará no Brasil).

Aproveitando a ideia (com reforma ortográfica) do pontapé inicial, começo também minhas considerações sobre a Copa do Mundo no Brasil. De modo geral, as escolhas teriam sido imunes a críticas, caso o país tivesse se restringido ao número de dez cidades proposto pela FIFA. Entretanto, foram inserir mais duas e o negócio começou a complicar.

Digo isto porque, com respeito à população das duas cidades, é um assombro incluir Cuiabá e Manaus como subsedes da Copa.

Primeiro, porque a localização geográfica de ambas as cidades dificulta a conexão delas com o resto do país para a montagem dos grupos. Explico-me: normalmente as Copas do Mundo dividem cada grupo entre duas ou três cidades, relativamente próximas entre si. Tal divisão consegue ser feita para todas as demais regiões brasileiras contempladas pela escolha da FIFA: quatro cidades no Nordeste - Recife e Salvador, Fortaleza e Natal, as "dobradinhas" para cada grupo podem ser feitas segundo esta divisão -; três no Sudeste - Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, o centro nervoso do país, com ampla facilidade de conexão entre tais cidades -; e duas no Sul - Porto Alegre e Curitiba, também suficientemente próximas e com grande oferta de transporte.

Entretanto, quem fará o par com Cuiabá, isolada no Centro-Oeste? E com Manaus, situada no coração da Amazônia? O apelo turístico-ambiental do Pantanal e da Amazônia não poderia por si só justificar a imposição destas duas sedes.

De fato, se o problema era por a Copa na Amazônia, a escolha lógica era por Belém, que tem um estádio moderno, que carecia de reforma pontual, e que, além disso, tem um público tradicional de futebol, com um clube que apresenta recente passagem pela Primeira Divisão e, portanto, apresentaria uma demanda para a utilização da arena desportiva após o final da Copa. Além disso, a recente revitalização da Zona Portuária da cidade cria um ambiente turístico com aparentemente mais opções que a capital do Amazonas, que terá que construir um estádio quase que integralmente novo e cuja utilização pós-Copa é duvidosa.

E Cuiabá? Se havia um fetiche por uma cidade do Pantanal, a opção seria Campo Grande. Cuiabá é uma cidade com clima quentíssimo (lembram-se da música do Skank? "...é não sentir calor, em Cuiabá") e sem qualquer tradição futebolística, pairando a mesma dúvida sobre a utilização de outro estádio que terá que ser quase que integralmente reconstruído.

Uma grande preocupação em mega-eventos como a Copa do Mundo é a subutilização dos equipamentos esportivos criados para a sua realização. Nas demais cidades escolhidas, pode-se considerar uma demanda razoável para as arenas a serem construídas ou reformadas.

Porto Alegre, Curitiba e São Paulo usarão estádios privados de grandes clubes da Primeira Divisão; Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Recife também têm clubes com tais características, embora seja questionável a opção pernambucana pela construção de um novo estádio, quando há três arenas que poderiam ser remodeladas - Arruda, Ilha do Retiro e Aflitos. Por sinal, quem irá usar o novo estádio, uma vez que os três grandes clubes da cidade têm seus próprios estádios?

Natal e Fortaleza estão sem clubes na Primeira Divisão, mas têm times na Segunda e que ocasionalmente frequentam a elite do futebol brasileiro, sem contar a tradição na afluência dos torcedores aos estádios nas duas cidades.

O único questionamento que remanesce é relativo a Brasília, que tendo reformado a grande custo financeiro o Bezerrão (estádio moderno em que o Brasil goleou Portugal no final do ano passado), reconstruirá o Mané Garrincha para um público de mais de 70.000 pessoas, com o único propósito de brigar pelo jogo de abertura da Copa. E depois? O Brasiliense terá força suficiente para gerar utilização satisfatória da arena? Lembre-se que o Bezerrão é do Gama, a única outra força de expressão do Distrito Federal em âmbito nacional.

Deste modo, fica o alerta para um eventual desperdício de dinheiro público, com a remodelação ou a construção de estádios que se tornarão "elefantes brancos" após 2014.

3 comentários:

Zé Eduardo disse...

Fernando,

Agora pode contar 19, adoro a ideia de um blog, principalmente sobre futebol, não gosto do Milton Neves mas dessa vez ele tem razão. Quanto ao assunto me questão, não acredito que teremos elefantes brancos em todas as cidades sede, posso falar com certeza de Natal, cidade que espero um dia que voce venha conhecer e nos visitar.O projeto de natal, contempla antes de tudo, um complexo cultural e esportivo, com museu, shopping center e parque ecológico, além da reformulação do centro administrativo, é inegável ainda o que um evento desse porte pode significar para uma cidade turística como Natal. Quanto a Pernambuco, com a criação do novo complexo esportivo, o sport e, se não me engano, o Nautico, passarão a mandar seus jogos lá, desativando seus estádios. Continue escrevendo primo. Voce ganhou um assiduo leiotr de blogs.
Abraços

Sergio Pyrrho disse...

Grande Fernando,
Vim visitar seu blog e fiquei muito bem impressionado com a qualidade da sua análise sobre a esquisitice da escolha de Cuiabá e Manaus como sub-sedes da nossa Copa de 2014.
Com tanta sensatez no seu comentário, surpreendeu-me ver, em post anterior, que você é rubro-negro (pois lhe cairia melhor a veste tricolor).
Grande abraço,
Sergio Pyrrho

Felipe Barbalho disse...

Animal, é o que sempre comento por aqui sobre a organização de grandes eventos esportivos no Brasil: baita oportunidade para meterem um pouco mais a mão no nosso dinheiro e gastarem com o que não é urgente e prioridade. Dirão os empolgados: "Deixa de ser chato!" "Temos capacidade de organizar uma Olimpíada". "Quer dizer que não podemos sonhar?" "O legado para as cidades é o que importa" Pois bem, a herança do Pan ao Rio esta sendo muito bem aproveitada... E, não, dinheiro público não é para gastar com "cachaça"! Quando vejo os responsáveis pelos comitês organizadores de cada cidade-sede aqui no Brasil dando entrevistas, chego a ter calafrios... Também, o que esperar de um país que tem como ministro na área um sujeito tão "preparado". Bom, deixa essas chatices de lado e vamos papear sobre o lado lúdico do esporte. Isso sim merece nossas linhas. Beijos!
PS: Primo Zé Eduardo? É do ramo pernambucano da "famiglia"?