sexta-feira, 17 de agosto de 2012

O JOGO É OUTRO

Encerrados os Jogos Olímpicos, fazem-se muitos balanços e a conclusão que se chega é que nosso desempenho está abaixo do esperado; que nosso número de pódios é incompatível com o volume de investimentos e que nossa classificação final no quadro de medalhas é risível diante do nosso PIB.

Outro movimento simultâneo é aquele promete mais recursos, mudança de políticas públicas para o esporte, sempre visando a uma melhora do resultado aparente: o número de medalhas.

Como uma síntese deste diálogo de surdos, algumas vozes mais sensatas, como a de Amir Somoggi, em recente post na página da Meio e Mensagem, lembram que uma nação olímpica não se mede necessariamente pela quantidade de láureas em determinada edição dos Jogos, mas pelo efetivo entranhamento de uma cultura esportiva em sua sociedade.

Neste ponto, lembro-me sempre de Renato Maurício Prado, em passagem já citada anteriormente neste blog, na qual ele afirma, não sem uma dose de razão - e outra de radicalismo -, que brasileiro não gosta de esporte, mas de ganhar.

Gostávamos de Fórmula 1 porque tivemos Fittipaldi, Piquet e Senna quase em sequência; entendíamos tudo de top spins e back hands não porque nos apaixonamos pelo tênis, mas por conta de um vencedor como Gustavo Kuerten.

Há uma certa verdade nisto, mas também há, por trás destas veleidades de uma nação jovem como a nossa, um desejo incontido pelo triunfo, uma aptidão inata para a disputa atlética, uma vocação maravilhosa para se emocionar, parafraseando Armando Nogueira (em outra passagem já citada neste blog), com heróis forjados em pistas e quadras, em vez de trincheiras; emoldurados pelo verde de campos de futebol, e não pelo vermelho do campo de batalha.

Portanto, o brasileiro que gosta e acredita no esporte como elemento transformador da sociedade percebe claramente seu enorme potencial, e se desilude com a leviandade com que o assunto é tratado por quem por ele deveria zelar.

Entretanto, em vez de termos uma postura cínica, afirmando que os Jogos Olímpicos não servirão para nada; ou adotarmos um inconformismo estéril, achando que nenhum progresso será suficientemente bom, temos que virar o jogo.

Tal como um judoca, que usa o peso do oponente para desferir seu golpe com mais contundência, temos que aproveitar o que poderia ser uma precoce responsabilidade em sediar os Jogos Olímpicos, e transformá-la num desafio que nos leve além das expectativas.

É evidente que estamos longe da tradição esportiva que propulsiona EUA, Grã-Bretanha e Rússia para o topo do quadro de medalhas; não resta dúvida que não desenvolvemos, até agora, estruturas de evolução técnica que turbinaram o desempenho de Austrália e Coreia do Sul, mas o fato concreto é que o jogo está posto.

Sediaremos os Jogos daqui a quatro anos, e agora não importa mais se fizemos ou não o dever de casa que teria nos levado, já agora em Londres, a uma performance sensivelmente melhor do que as anteriores. É claro que as novas Bolsas prometidas (Ouro, Pódio, Atleta, o que seja) são meros paliativos e não resgatam o ideal de um esporte educacional forte, de uma sociedade engajada em eventos esportivos regulares e bem geridos.

Entretanto, os Jogos serão daqui a quatro anos, e, ainda que não tenhamos toda a estrutura ideal - aliás, provavelmente não tenhamos quase nada de tal estrutura -, não podemos fazer vergonha em casa.

Com ou sem esporte na escola; com ou sem Centros de Treinamento; com ou sem política esportiva organizada; não poderemos ganhar somente 15 medalhas em 2016.

Então, como o ótimo é inimigo do bom, tratemos de lapidar o que já temos: identificando jovens realidades e promessas já consolidadas; enrijecendo os emocionais de nossos favoritos e fortalecendo aqueles atletas que estão às portas do sucesso internacional.

A meta já está posta pelo próprio Comitê Olímpico Brasileiro (COB): ficar entre os dez primeiros, o que hoje significaria ganhar 8 medalhas de ouro. Temos que parar de nos "bronzear" e entrar para "limpar a mesa". Subimos ao pódio em todas as edições do torneio olímpico de Vôlei de Praia? Ótimo, mas só ganhamos ouro duas vezes. Temos que fazer a festa em Copacabana.

Ganhamos medalha desde 1984 no Judô? Excelente, mas temos que ter um desempenho à altura de uma Rússia em 2012, com pelo menos três campeões (já fizemos isto no Mundial que aconteceu aqui no Rio mesmo, em 2007).

Muita pressão? Já falei no post anterior que acabou o discurso de vitimização. Nosso esporte tem recursos. Grande parte dos atletas já tem uma vivência internacional que as gerações anteriores jamais tiveram. Como se diz por aí, se não sabe brincar, não desce para o play. Se não aguenta a pressão, pede para sair.

A vida real vai ser assim. Vai ter pressão até 2016.

A meta já está posta: 8 medalhas de ouro, pelo menos o 10o. lugar na classificação geral. Temos os dados e os resultados. Precisa-se de planejamento. O qual, pelo que parece, já está feito pelo COB.

Mas que a maldição grega, da qual corremos na economia, também não nos pegue no esporte: não façamos da meta de 2016 um fim em si mesmo. Aqui também o jogo é outro. O desempenho nos Jogos do Rio não podem ser o alvo de um tiro só, mas a plataforma que sustentará nosso salto para o futuro.

Que a busca pelas medalhas de 2016 possa despertar o debate em torno do esporte escolar e universitário; que a melhora dos investimentos forme uma nova e mais eficiente leva de gestores esportivos; que o desejo pelo pódio olímpico produza novos e inesperados encontros de nossa população com outras e inusitadas modalidades (o tiro com arco espera pelos barrigudos de plantão!!!).

Como já se afirma mercadologicamente por aí, "os Jogos são do Brasil". Está na hora dos amantes do esporte apropriarem-se deles. A oportunidade está na mesa, o jogo é outro. Vamos sair do buraco e apostar alto, em busca de sequências, ases e combinações de ouro.

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